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Nous allons à Bordeaux pour acheter du vin rouge
Eu estou fazendo um curso online de francês. E deparei-me a seguinte tradução para a frase reproduzida no título: "Vamos à Bordeaux para comprar vinho tinto".

Como eu sou um genuíno "pé no saco", resolvi escrever algumas linhas.

Vai saber... Quiçá a minha chateza tenha préstimo para alguém. Toma aí:

Eu vou estender-me um pouco para esmiuçar acerca da crase que, hoje, dia nove de junho de dois mil e dezoito, encontra-se diante do nome da cidade francesa "Bordeaux" e não deveria estar ali. Em seu lugar, deveria prevalecer apenas a preposição "A" sem o acento grave.

Fiz questão de enfatizar a data pois (todos nós esperamos) chegará o dia em que esta pendência será sanada e esta publicação - creio eu - permanecerá.

Eu escrevi este texto agora, em trinta minutos, não o submeti ao processo de revisão e consultei exclusivamente a minha memória. Portanto, espero que ele seja útil.

Existe uma regra para o uso da crase quando precede uma nomenclatura designativa de lugar.

Há localidades às quais nos referimos mediante o emprego do artigo feminino "A", como "A Argentina", "A Paraíba", "A França", "A Bahia", "A China", etc.

Para outras porções territoriais, convencionou-se a aplicação do artigo masculino "O" na anteposição do nome: "O Vaticano", "O Ceará", "O Japão", "O Brasil", etc.

Também utiliza-se o plural ao mencionarmos determinadas divisões espaciais, sendo exemplos os Estados Unidos e os Países Baixos.

E ainda restam as terras que, quando mencionadas, não são acompanhadas por artigo nenhum, como: "Mônaco", "Pernambuco", "Portugal", "Curitiba", etc.

A crase nada mais é do que um artifício para marcar a fusão da preposição "A" + artigo "A". (A + A = À)

Você vai A A Bulgária = Você vai à Bulgária. (com crase)
Por isto, não existe crase antes de palavra masculina, pois, neste caso, ao falarmos que vamos a algum lugar, temos a combinação da preposição "A" com o artigo "O". (A + O = AO).

Você vai A O Paraguai = Você vai ao Paraguai.
E quando não há uso de artigo, tão somente a preposição é o bastante:

Você vai A Israel = Você vai a Israel. (sem crase)
Se você vai a algum lugar cujo artigo "A" é utilizado em sua nomenclatura, você diz que volta DA:

Você vai À Escócia - Você volta DA Escócia.
(sendo DA a contração da preposição DE com o artigo A).

Se você vai a algum lugar cujo artigo "O" é utilizado em sua nomenclatura, você diz que volta DO:

Você vai AO Líbano - VOCÊ volta DO Líbano.
(sendo DO a contração da preposição DE com o artigo O).

Se você vai a algum lugar cujo artigo "OS" é utilizado em sua nomenclatura, você diz que volta DOS:

Você vai AOS Estados Unidos - Você volta DOS Estados Unidos.
(sedo DOS a contração da preposição DE com o artigo OS)

Se você vai a algum lugar cuja nomenclatura não é acompanhada de artigo nenhum, você usa somete a preposição DE para dizer que você volta deste deste mesmo lugar.

Você vai A Singapura - Você volta DE Singapura.
(sendo o DE apenas uma preposição empregada pura e simplesmente sem contrair-se com nenhum artigo).

Dito isto, fica fácil entender porque esta crase anteposta a Bordeaux (ou a Bordéus, para quem preferir utilizar o nome em Português, que o sistema deveria aceitar neste tópico como aceita em outros exercícios) NÃO deveria existir, pois:

Se você volta DE Bordeaux - Você vai A Bordeaux. (sem crase)
Há também um macete, um versinho que, se cantado, é ainda mais eficiente para memorizar este conceito. Ei-lo:

Volta DA, crase no A - Volta DE, crase pra quê?
Um recurso simples e eficaz que pode fazer-nos recordar esta regra, mesmo após transcorridos muitos anos.

A matéria está consumada, mas, já que eu acabei alongando-me tanto, vou adentrar em mais algumas particularidades a que eu reputo relevância:

1 - A crase NÃO é o acento. A crase é a fusão da preposição A com o artigo A. O sinal gráfico é denominado "acento grave".

A despeito do significado de crase como acento haver sido dicionarizado por conta do uso corrente na linguagem do dia-a-dia.

2 - Geralmente, os nomes de bairros são empregados com o uso do artigo e os nomes de cidade SEMPRE sem artigo.

Quando Adoniran Barbosa cantava "Moro em Jaçanã, se eu perder esse trem que sai agora às onze horas...", ele faz parecer que Jaçanã é uma cidade, quando, verdadeiramente, é um bairro da zona norte de São Paulo, portanto, deveria ser cantado "Moro no Jaçanã".

Aliás, por falar nisto, neste instante, veio à minha mente, mais um destaque:

Só o fato de Bordeaux ser uma cidade já é o suficiente para lembrarmos que não devemos grafá-la de modo associado à crase. Se você não fixar no intelecto a regra e o versinho-macete, rememore apenas que Bordeaux é uma cidade e portanto não há a incidência de crase.

A única exceção seria se Bordeaux estivesse especificada por uma expressão adjetiva. Se, em vez de dizer que nós vamos a Bordeaux para comprar vinho tinto, dissermos que vamos "à Bordeaux dos vinhos tintos", aí, sim, e somente assim, a crase torna-se necessária e obrigatória.

Nós vamos À Bordeaux dos vinhos tintos.

3 - Quase todas as unidades federativas do Brasil (estados) são empregadas com o uso do artigo masculino ou sem artigo nenhum.

Portanto, que eu me lembre agora, só dizemos que "voltamos DA Paraíba e da Bahia", que talvez sejam os únicos em que se usa o artigo feminino. Para os demais estados, dizemos que "voltamos DO ou DE". Isto nos faz concluir que crase na regência do verbo ir para estados brasileiros, somente quando dizemos que vamos à Paraíba ou à Bahia.

Eu vou À Paraíba - Pois eu volto DA Paraíba.
Eu vou AO Paraná - Pois eu volto DO Paraná.
Eu vou A Pernambuco - Pois eu volto DE Pernambuco.

Marcelo Garbine
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